Características


Comunicação


A comunicação é a base para as interacções sociais e emocionais entre as pessoas. A capacidade de comunicar é complexa, pois envolve o desenvolvimento de várias fases e o uso de linguagem verbal e não verbal.
A linguagem é um código social partilhado ou sistema convencional, para a representação de conceitos através do uso de símbolos e regras combinadas. Estes códigos são convencionais de modo a que possam ser entendidos pelo grupo social que os utiliza.
A comunicação é o processo de troca de informações e ideias entre participantes. Comunicar envolve processos dinâmicos internos e externos, interacções sociais e ambientais, com processos cognitivos subjacentes.
Geralmente, os défices de comunicação nas crianças com PEA apresentam-se ao nível da linguagem (linguagem expressiva) e do discurso.



Esta abordagem nega a importância de três aspectos da comunicação nestas crianças:

· Linguagem receptiva ou compreensão de verbalizações;


· Conhecimento receptivo, expressivo e uso de comunicação não verbal, incluindo expressões faciais, contacto ocular, voz, linguagem corporal;

· Desenvolvimento de linguagem internalizada ou capacidades meta-linguisticas e comportamentos de resolução de problemas.

Uma vez que a comunicação envolve vários aspectos, é essencial então discutir o desenvolvimento da comunicação intencional e a integração de aspectos da comunicação receptiva e expressiva.



Fases da Intencionalidade


As pessoas aprendem a comunicar através de um processo de desenvolvimento da intencionalidade. A intencionalidade é o uso significativo do comportamento (discurso, gestos, acções) para a interacção com outras pessoas, partilha de sentimentos, pensamentos ou desejos. Esta capacidade progride de acordo com as fases: perlocutionary, illocutionary e locutionary.



Perlocution – Após o nascimento, os bebés não conseguem comunicar os seus desejos, pensamentos através de comportamentos intencionais com significado. Normalmente, o cuidador interpreta os comportamentos do bebé como intencionais, suportando uma interacção intencional. Esta fase ocorre durante os primeiros 6/9meses de vida. No entanto, muitas crianças com PEA, prolongam esta fase de intencionalidade. Estas crianças podem exibir variados comportamentos e têm grande dificuldade em direccionar os seus comportamentos para outra pessoa. Elas não entendem a influência das consequências dos seus comportamentos nos outros.

Illocution- (6/12 meses)

A criança desenvolve um conjunto de comportamentos intencionais de comunicação. Entre estes, o aparecimento de atenção conjunta, ou contacto ocular com outra pessoa ou objecto. Alguns gestos também emergem, tais como aqueles que transmitem a habilidade de apresentar, dar, guiar, alcançar e apontar.

Muitas crianças com PEA demonstram défices da capacidade de illocution. Os défices mais notórios estão na atenção conjunta e na capacidade de apontar. Demonstram também dificuldades em trocar a atenção de um objecto para uma pessoa. Estes défices interferem com a capacidade de interagir com os outros, e com o desenvolvimento da linguagem. Estas crianças também apresentam dificuldades em ler e interpretar os comportamentos de illocution dos outros. Por exemplo, têm dificuldade em interpretar emoções exprimidas pelas expressões faciais dos outros. Consequentemente, a interacção pode ser stressante para ambas as partes.

Llocution
(12/18meses)
As crianças começam a usar palavras ou comportamentos intencionais.
As crianças com PEA desenvolvem apenas o uso mínimo de comunicação verbal intencional. Outros, conseguem comunicar verbalmente, mas as suas falas são difíceis de entender.


Uso e compreensão de comunicação e comportamentos não-verbais


Algumas crianças com PEA na fase do desenvolvimento intencional, demonstram linguagem expressiva, e habilidades no vocabulário, gramática e construção sintáctica. No entanto, uma vez que estas crianças podem também demonstrar uma capacidade limitada em interpretar e usar sinais não verbais, a interacção e a interpretação de emoções encontram-se alteradas. Estes défices geralmente, encontram-se em crianças com síndrome de Asperger. Estas, normalmente demonstram défices de socialização.


Formas de linguagem e Ecolália


Muitas crianças com PEA apresentam ecolalia que é a imitação. Existem duas formas de ecolalia: atrasada e imediata.
Ecolalia atrasada ocorre quando a fala é repetida do passado. Por exemplo, a criança ouve “ o chocolate é bom” na hora de almoço, e repete no recreio quando esta no baloiço “ o chocolate é bom”.
Ecolalia imediata ocorre quando a criança repete o que o outro acabou de dizer. Frequentemente, ecolalia imediata reflecte a incapacidade da criança em compreender o que foi dito.
As crianças que apresentam ecolália, usam linguagem verbal para a função comunicativa, mesmo quando essas expressões imitadas não combinam com a mensagem que pretendem transmitir. Isto é, a criança diz “o chocolate é bom” mesmo quando se refere a outros tipos de alimentos. Para outras crianças, a ecolalia reflecte o seu estilo de aprendizagem. Nestes casos, a ecolalia transmite que a criança aprende sobre o meio através de “gestalt”. Eles lembram-se de frases completas e de quando elas foram usadas, e depois repetem-nas em contextos similares. Este tipo de comportamento pode demonstrar a incapacidade de compreenderem o vocabulário e a estrutura das frases.


Comunicação e meta-linguística


Algumas crianças com PEA, principalmente aquelas com Síndrome de Asperger, demonstram dificuldades na compreensão do vocabulário abstracto ou metafórico e linguagem que represente humor, sarcasmo, ironia. Apesar dessas crianças possuírem uma compreensão e uso da linguagem mínima, elas apresentam défices na capacidade de interpretar e usar pistas não verbais, e na capacidade de interpretarem linguagem figurativa. Podem também apresentar défices significativos na capacidade de usar linguagem que reflicta o seu próprio comportamento. Esta capacidade pode ser denominada como self-talk, teoria da mente ou função executiva. A linguagem interna pode ser percebida como um aspecto metalinguistico da comunicação.


Socialização

A capacidade de envolvimento em interacções sociais requer uma complexa integração de linguagem, linguagem não verbal e componentes cognitivos e emocionais. A linguagem não verbal inclui contacto ocular, gestos, expressões faciais e tom de voz para comunicar mensagens emocionais.
As crianças com PEA podem apresentar défices de socialização que interferem no desenvolvimento de relações com os pares, família e comunidade.

Propósito da Socialização


A socialização requer pelo menos dois partidos – parceiros de comunicação – que interagem para partilhar desejos, necessidades, sentimentos e pensamentos. Essa partilha ocorre através da integração de linguagem e do uso de linguagem não verbal, que combina gestos, contacto ocular, expressões faciais e palavras que pedem acções, objectos, ajuda, informação e clarificação; para conseguir chamar a atenção e cumprimentar; para comentar, providenciar directivas, informações e clarificações; e para protestar. A capacidade de socializar usando todas estas funções é uma tarefa complexa.A tabela seguinte apresenta comportamentos que reflectem défices na socialização, que as crianças com PEA podem demonstrar.














Frequência e papéis de socialização


Dentro da díade social, os indivíduos entendem e usam linguagem e comportamentos verbais e não verbais para iniciar e responder às interacções iniciadas por outros. Os papéis sociais de emissor e receptor podem trocar rapidamente durante a conversação, requerendo que ambas as partes possuam habilidades sociais efectivas para cada papel, e que ambos tenham a capacidade de interpretar pistas não verbais. Quando as pessoas têm dificuldades em iniciar ou responder, as interacções sociais podem criar frustração e confusão. Igualmente, se as pessoas não conseguirem trocar de papéis na conversação, a interacção pode tornar-se num monólogo.
Muitas crianças com PEA manifestam dificuldades significativas no uso, interpretação e compreensão da linguagem e comportamentos não verbais. A tabela seguinte mostra uma lista de comportamentos comuns que indicam défices na frequência e papéis de socialização.











Interacções Sociais


As crianças com PEA podem ter dificuldades em interpretar ou ler. Défices na legibilidade das interacções sociais incluem o uso desapropriado de comportamentos, uso inconsistente de comportamentos comunicativos, e excesso de uso de comportamentos desapropriados para uma variedade de diferentes propósitos. Estas crianças podem usar comportamentos desadequados, como gritar, bater em si próprio, repetição de movimentos. Estes comportamentos são difíceis de interpretar pelo outro. Na tabela seguinte estão algumas indicações de défices na legibilidade.











Capacidades de conversação


Algumas crianças com PEA apresentam dificuldades em suster interacções. Uma interacção típica requer o início de um evento que é expandido através do uso de várias funções pragmáticas: pedidos para clarificação, informação e elaboração; comentários; protestos; e providenciar clarificação, informação e elaboração. Através destes actos, a conversação desenvolve-se quando a pessoa pergunta e responde durante a discussão.
As crianças com PEA que não falam, podem não experienciar interacções sociais devido ao seu limitado reportório.

Comportamentos Repetitivos



Propósito

Um dos critérios de diagnostico para a PEA inclui a presença de actos repetitivos, comportamentos que normalmente servem para um propósito específico e podem ser vistos de quatro formas: podem reflectir um estado de ansiedade, ou indicar a presença de uma desordem obcessiva-compulsiva, ou podem representar a necessidade de auto-regulação para manter a calma e o estado de alerta, ou podem reflectir dificuldades com idealização ou capacidade para criar um plano.
Na tabela seguinte registam-se alguns exemplos de comportamentos repetitivos de crianças com PEA.




















Cognição


As crianças com PEA podem ter um QI que pode ir desde atraso mental a genial. Pode ser difícil avaliar a capacidade intelectual destas crianças porque a sua sintomatologia é complexa.
Estas crianças têm um estilo de aprendizagem gestalt que as leva a serem rígidas no seu pensamento, e a terem dificuldades na abstracção. Este estilo de aprendizagem pode estar relacionado na forma como os eventos são conceptualizados, o significado que lhes é dado e quais os detalhes que são percebidos como mais importantes.


Alterações das competências de Processo:


1. Falta do conceito de sentido.

O problema primário, que caracteriza o pensamento de indivíduos com PEA, é a inabilidade de dar sentido às suas experiências. Os indivíduos actuam nos ambientes, podem aprender habilidades, alguns podem aprender a usar a linguagem, mas não têm capacidade intrínseca de entender o significado das actividades, não estabelecem relações entre ideias e eventos. O mundo deles baseia-se numa série de experiências e procuras sem relação umas com as outras. Os temas, conceitos, razões ou princípios subjacentes são, para eles, tipicamente obscuros.


2. Focagem excessiva em detalhes.


Alunos com autismo são, com muita frequência, muito bons na observação de pormenores, especialmente os visuais. Alguns deles notam particularidades sensoriais, como os sons de ventiladores e máquinas. Indivíduos com um QI mais elevado usualmente concentram-se em detalhes mais cognitivos, tais como de estações de rádio, códigos de área de números de telefone, ou capitais de estados. Porém são incapazes de perceber a importância relativa de todas essas minuciosidades que foram observadas.



3. Falta de Concentração.


É frequentemente difícil as crianças com PEA prestarem atenção àquilo que os professores querem, porque estão concentrados em sensações que, para eles, são mais interessantes e importantes. Além do mais, os seus focos de atenção, com frequência, mudam, rapidamente, de um objecto para outro. Geralmente as fontes de distracção de crianças de nível funcional mais baixo são visuais, por exemplo um professor pode colocar um lápis numa mesa e a criança ficar tão distraída pelo lápis que não consegue executar o trabalho. Os estímulos auditivos podem ser também fonte de significativa distracção, por exemplo, um aluno pode ouvir um ruído que o professor e colegas nem sequer ouvem e ficar incapaz de se concentrar. Algumas crianças com PEA são também, aparentemente, sujeitos à dispersão por estimulação interna, cognitivos internos, rimar, contar, calcular ou recitar factos que tenham memorizado. Alguns deles olham, movem-se e exploram o ambiente constantemente, como se todas as sensações fossem igualmente novas e excitantes, outros ficam muito concentrados num tipo muito limitado de objectos.



4. Pensamento Concreto

Crianças com PEA, independentemente do nível cognitivo, têm relativamente maior dificuldade com conceitos linguísticos simbólicos ou abstractos do que com factos e descrições objectivas. Cada palavra significa apenas uma coisa; elas não têm conotações adicionais ou associações subjacentes.



5. Dificuldade em Combinar ou Integrar Ideias



É mais fácil para pessoas com autismo entender factos ou conceitos isolados do que combinar conceitos, ou integrá-los com informações relacionadas entre si, particularmente quando estes conceitos parecem ser de alguma forma contraditórios.


6. Dificuldade em Organizar e Sequenciar


Os problemas com organização e sequenciação estão relacionados com a dificuldade global de integrar múltiplas informações. A capacidade de organizar requer a integração de vários elementos para atingir um objectivo predeterminado. Por exemplo, se alguém está a planear uma viagem, esta pessoa tem que prever o que será necessário levar para fazer as malas, antes de sair. Outro exemplo seria a necessidade de colectar todos os materiais necessários antes de completar, detalhadamente, uma tarefa. As capacidades de organização são difíceis para pessoas com autismo porque elas requerem, simultaneamente, a capacidade de concentração tanto na tarefa imediata quanto no resultado pretendido. Por exemplo, uma criança com PEA pode levantar-se pela manhã, pentear o cabelo, depois tomar banho e lavar o cabelo. Desta forma, reconhece-se que apesar de terem dominado as etapas isoladas de um processo complexo, eles não entendem a relação entre as etapas ou o sentido destas etapas, em relação ao objectivo final.


7. Dificuldades em Generalizar


Indivíduos com PEA, frequentemente aprendem habilidades ou comportamentos numa situação, mas têm grande dificuldade em transferi-las para outra situação. Por exemplo, eles podem aprender a escovar os dentes com uma escova de dentes verde e depois recusar-se em escovar os dentes com uma escova de cor azul. Eles podem aprender a lavar pratos, mas não perceber que o mesmo procedimento básico é usado para lavar copos, do mesmo modo podem aprender a enunciar literalmente uma regra, mas não o seu propósito subjacente e, então, terem problemas em aplicá-la em situações diferentes entender.



Brincar



O brincar envolve a integração desenvolvimental de vários componentes: idealização, resolução de problemas e representação mental.
As crianças com PEA podem demonstrar dificuldades na idealização. O brincar parece ser aberrante. Estas crianças parecem criar uma estranha afinidade com determinados objectos, ou o seu brincar pode ser demasiado repetitivo. Elas preferem um brincar construtivo, em oposição a um brincar de faz-de-conta. Algumas crianças fazem construções complexas ou desenham figuras intrigantes e mapas detalhados. Por vezes, estas crianças demonstram um brincar que reflecte atraso de desenvolvimento.
Normalmente, elas preferem brincar sozinhas. O brincar social requer a capacidade de gerir várias capacidades - desde compreender a linguagem utilizada pelo outro até conhecer as regras de dialogo. Comunicação, socialização, cognição e capacidade motora são requisitos necessários para o brincar social.


Processamento Sensorial


Vários estudos têm proposto que crianças com PEA experienciam dificuldades no processamento sensorial. Algumas pesquisas indicam que estas crianças demonstram respostas atrasadas a estímulos, e dificuldades em trocar a atenção entre coisas, por exemplo. Na tabela seguinte estão registadas indicações de dificuldades de processamento sensorial.
















Percepção Sensorial


Nas primeiras teorias cognitivas acerca do autismo, os distúrbios sensoriais foram uma área bastante abrangida.
Ornitz e Ritvo (1986) declararam nas seus casos de autismo a existência de crianças hipo e hipersensíveis. Baseados nestas observações, eles postularam que a incapacidade de modelar adequadamente o input sensorial nas crianças autistas, manifesta-se em estados de excitação (ex: rodar, bater palmas, hipersensibilidade a estímulos) e de inibição (ex: não responsivos), e que esse estado de desregulação ou desequilíbrio homeostático leva a uma inconstância perceptiva.
Assim, a modulação inadequada do input sensorial nos autistas, produz inconstância e desordem na percepção dos eventos externos.
A falta de coerência na percepção destas crianças causa impacto nas aquisições desenvolvimentais, incluindo interacção social e comunicação. Os comportamentos relacionados incluem: olhar vazio, fascinação visual, padrões de movimentos, incapacidade de reagir a sons, hipossensibilidade à dor, frio ou calor, hipersensibilidade aos sabores e uso inapropriado de objectos (ex: interesse em aspectos sensoriais de objectos, como lamber, colocar na boca, ou sentir a textura).



Regulação Emocional

A regulação emocional envolve o desenvolvimento de três níveis: fisiológico, social e cognitivo.
Uma criança com PEA pode demonstrar défices fisiológicos na regulação emocional, que ocorre no tronco cerebral e desencadeia a resposta luta - fuga.
A nível cognitivo, os humanos usam funções cognitivas na razão, na resolução de problemas e quando gerem os impulsos. Essas são denominadas as funções executivas, e incluem self-talk, capacidades metacognitivas e metalinguisticas. Isto pode estar afectado nas crianças com PEA.
Outras crianças podem apresentar défices a nível social. Esta área é normalmente denominada como regulação mútua e envolve a obtenção de suporte dos outros no ambiente, de forma a ir de encontro às suas necessidades individuais. As crianças com PEA podem não possuir ferramentas de comunicação verbal e não verbal que precisam para a regulação (mútua) sócio-emocional, e por isso podem exibir comportamentos atípicos que são difíceis de interpretar pelos outros.
A tabela seguinte apresenta indicadores de problemas de regulação emocional das crianças com PEA.











Capacidades Motoras


O DSM-TR-IV não inclui as capacidades motoras no diagnóstico de PEA. No entanto, a literatura indica que crianças com PEA por vezes exibem atrasos e dificuldades no desenvolvimento motor. Exemplos: falta de domínio das mãos, hipotonia, dispraxia, etc.
A tabela seguinte mostra algumas dificuldades motoras que as crianças com PEA podem apresentar.



















Bibliografia:

· American psychiatric association. (2002). DSM-IV-TR Manual de diagnóstico e estatística das perturbações mentais. 4ªedição, Climepsi Editores. Lisboa.
· Koupernick, C., Lebovici, S., Widlocher, D. (1978). Psicoses Infantis (1ªed.), Vega Universidade, Lisboa.
· Trevarthen, C., Aitken, K., Papoudi, D., Robarts, J. (1996). Children with Autism: diagnosis and interventions to meet their needs, Jessica Kingsley Publishers, Londres.
· AOTA Press (2004), Autism: a comprehensive occupational therapy approach (2ºed.). Heather Miller- Kuhaneck MS,OTR/L,BCP Editor, Montgmory Lane.






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